Abdu Ferraz
BrasilAshoka Fellow desde 2006

Embora quase metade da população tenha ascendência africana, as escolas brasileiras não ensinam muito sobre a história, cultura e herança dos afro-brasileiros. Abdu Ferraz está ajudando escolas e empresas a adotar uma imagem mais positiva da África e das oportunidades que ela apresenta.

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A Pessoa

Abdu Ferraz nasceu numa aldeia de Sanza Pombo, no norte de Angola. Os seus pais eram membros do Movimento Popular de Libertação de Angola, grupo no poder que defendia o socialismo africano. Desde a independência, Angola sofreu uma guerra civil devastadora. A fim de escapar do serviço militar em condições tão horrendas, os pais de Abdu falsificaram sua certidão de nascimento para reduzir sua idade em quatro anos. Seus pais queriam que ele fosse para a Europa estudar e morar com o irmão e o primo. Em vez de seguir os desejos de seus pais, Abdu aos 16 anos matriculou-se no seminário e se formou em filosofia em 1995. Durante este período, ele desenvolveu talentos artísticos em poesia, contação de histórias, antigas religiões de seu povo, e em seu último ano tornou-se o editor do jornal do seminário. Em 1995, Abdu foi transferido para o Brasil para completar seu treinamento no seminário. No ano seguinte, ele ficou desiludido com o clero e mais preocupado com a vida dos afro-brasileiros. Em 1996, após deixar o clero, Abdu voltou para Angola. Porém, meses depois, Abdu voltou ao Brasil. Entre 1996 e 1999, Abdu foi colunista do Jornal Bragança Diário onde desenvolveu o projeto Educação Paz e Amor, trabalhando com diversas culturas em torno da educação. Em 1999, ele criou o certificado de “Amigo da África” que concedeu aos brasileiros que se dedicaram a desenvolver uma relação África-Brasil para formalizar seu compromisso. Uma experiência que simboliza o espírito de perseverança que sempre esteve presente em Abdu foi uma greve de fome em 1999 em Brasília para protestar contra a venda de armas brasileiras a Angola. Naquele ano, seu pai foi preso por se opor ao conflito armado em Angola. Após um período de reflexão, Abdu auditou o programa de mestrado em ciência política da Universidade de Campinas, onde se dedicou ao desejo de trazer a história e a cultura africana para a sociedade e a educação brasileiras. . Com essa determinação, Abdu foi a Diadema desenvolver seu projeto “Raízes do Brasil”. Com o Projeto Hummingbird e o Projeto de Apoio às Crianças em Risco, Abdu começou a trabalhar com a comunidade para conceituar uma imagem da herança africana. Com financiamento do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados conseguiu remodelar seu projeto e criar a PLEC com o objetivo de promover o continente africano nas escolas de São Paulo. Desde então, seu trabalho tem sido realizado em diferentes setores da sociedade brasileira. Abdu está ciente da importância de seu trabalho para as relações afro-brasileiras, bem como de sua responsabilidade como imigrante africano em promover a memória compartilhada e a cultura entre brasileiros e africanos como forma de superar o estranhamento e desconstruir os estereótipos que impedem a cooperação afro-brasileira.

A Nova Idéia

Abdu ataca os preconceitos raciais presentes na sociedade brasileira sobre a história e cultura africana. Vendo a dificuldade de gerar debate público sobre raça e discriminação, a Abdu criou o Programa de Vínculos Étnicos e Culturais (PLEC) para trabalhar com crianças, adolescentes e empresas. A Abdu oferece cursos pós-escolares para crianças e oficinas de reformulação do sistema educacional para a formação de professores de história da África. Com a percepção de que as crianças passam a maior parte do tempo depois da escola com seus avós, que cuidam delas enquanto seus pais estão no trabalho, para complementar seus esforços nas escolas, Abdu também trabalha com esses avós para ensiná-los sobre a cultura e história africana que eles podem compartilhar com seus netos. Por meio dos avós, ele consegue entrar no núcleo familiar e quebrar ainda mais os estereótipos negativos sobre a herança africana. Além do trabalho com crianças e adolescentes, Abdu tem como alvo o setor empresarial. Inicialmente, ele buscou estreitar as relações comerciais e culturais entre a África e o Brasil, trabalhando com empresas interessadas na economia africana. Ele também contribuiu para o aumento da demanda brasileira por produtos e serviços africanos, o que ajudou a gerar salários para os imigrantes africanos. Abdu acredita que após ser exposto a elementos de outras culturas, é possível amenizar a separação cultural entre a África e o Brasil e incentivá-los a trabalhar juntos para aumentar sua força no comércio internacional.

O problema

A escravidão, praticada da primeira metade do século 16 a 1888, configurou o padrão histórico do racismo institucionalizado no Brasil. A identidade do afro-brasileiro, que com mais de 80 milhões de pessoas constitui quase a metade da população, sempre esteve fortemente ligada à história da escravidão e à noção de inferioridade da raça negra. A exclusão e a falta de poder causadas pela discriminação racial estão presentes em vários aspectos da vida afro-brasileira. Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2003 confirmam que os negros ganham em média metade do salário dos brancos e apenas 2% da população negra vai para a faculdade. Esse contexto social contribui para a perpetuação do processo de exclusão de mais da metade da população brasileira. Em 2003 o governo aprovou uma lei exigindo que as escolas ensinassem história da África, mas muitas escolas ainda não cumpriram ou ensinaram sobre a África de forma positiva. . As escolas brasileiras tendem a ensinar sobre a história e a cultura africana de uma forma que dá aos alunos uma má impressão da África. Esse é um problema real para os alunos negros, que podem sair da sala de aula com um estereótipo negativo de sua própria cultura, herança e comunidades. Parte do problema é que os professores simplesmente não foram treinados neste assunto. As empresas também não dão a África a importância que ela merece. O Brasil pretende se tornar um ator global no comércio internacional e, portanto, não pode ignorar o significado comercial e político da África. Embora o comércio entre o Brasil e a África tenha aumentado nos últimos anos, as relações ainda estão subdesenvolvidas e mais poderia ser feito. O comércio na África em 2004 representou apenas 7% do comércio, enquanto a União Europeia representou 24%; os Estados Unidos 20 por cento; Ásia 17 por cento; Mercosul 10 por cento; e o resto da América Latina com 9%.

A Estratégia

Abdu originalmente criou o PLEC para promover o continente africano, melhorando a imagem da história, valores e tradições africanas, e encorajando a interação harmoniosa entre as culturas africana e brasileira. Após atuar em diversos eventos em espaços públicos estreitou seu foco para duas áreas específicas: escolas e empresas. Abdu busca reformar o sistema educacional para ter uma visão mais humanizada da África e empoderar os afro-brasileiros. Seu programa aproveitou a lei federal para entrar em sete Centros Unificados de Educação e duas escolas municipais das Coordenadorias de Educação do Butantã e do Ipiranga. O PLEC oferece 370 oficinas por mês com uma média de atendimento de 2.775 crianças e adolescentes, o que gera dois terços do orçamento da organização. A partir de março de 2006, Abdu expandirá suas oficinas para todos os 21 Centros de Educação Unificada de São Paulo. Esses cursos culminam em uma cerimônia de graduação. Ao ver seus filhos apreciarem a cultura africana, os pais também começam a aprender mais sobre a África. Abdu pede que os alunos respondam ao questionário que responderam no início. Isso serve como um indicador para verificar o quanto eles aprenderam. Abdu também trabalha com famílias. Em vez de envolver os pais diretamente em seus workshops, Abdu criou um programa para trabalhar com os avós. Ele percebeu que muitas famílias de baixa renda dependem dos avós para cuidar dos filhos enquanto os pais trabalham. Abdu firmou parceria com prefeituras e Centros Culturais de São Paulo para desenvolver cursos sobre cultura africana para avós, inclusive ensinando folclore africano. Este programa tem permitido um contato intergeracional entre eles e seus netos e consolidado uma nova interpretação da África e do ser negro no núcleo familiar. Abdu também trabalha para aumentar o número de professores capacitados para lecionar sobre história e cultura africana. Os ministros desses cursos são membros da PLEC: imigrantes africanos e brasileiros negros e brancos. A maioria dos cursos é oferecida em conjunto com autoridades governamentais, mas os indivíduos interessados podem se inscrever nas aulas ou em aulas individuais. Em 2004, o PLEC formou 200 professores de escolas públicas em São Paulo e 350 avós. Abdu acredita que a formação desses professores e avós é um passo necessário para ter mais gente preparada para divulgar seu trabalho e metodologia por São Paulo e pelo país. Além disso, o PLEC organizou diversos eventos em outros municípios do estado de São Paulo. A outra área de trabalho da PLEC é melhorar as relações comerciais entre a África e o Brasil. A estratégia é aumentar a demanda por bens e serviços africanos. Por meio da PLEC, Abdu pode adquirir diversos produtos africanos que utiliza em suas oficinas e vender nas exposições e convenções de que participa. Abdu acredita que para mudar a imagem da África no Brasil, o brasileiro deve entrar em contato com produtos africanos e cultura. Assim, por meio do uso de produtos africanos no ensino e na venda de artesanato, Abdu permite que o povo brasileiro experimente diferentes partes da cultura africana e reflita sobre as conexões que possam ver entre a cultura brasileira e a africana. Com a venda desses produtos, a Abdu é capaz de gerar o terço restante do orçamento da PLEC.