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Claudia Cotes
BrasilVez da Voz
Ashoka Fellow desde 2011

É impossível pensar no exercício pleno da cidadania sem acesso à informação. Hoje, milhões de brasileiros com deficiência levam vidas marginalizadas devido à inexistência de programas, jornais e rádios que utilizam tecnologia acessível. Percebendo isso, Claudia Cotes fundou o programa Vez da Voz, ou Time for a Voice, para democratizar o acesso à informação e criar oportunidades para pessoas com deficiência participarem ativamente da sociedade.

#Brasil#Acessibilidade#Linguagem de sinais#Televisão#Mídia de massa#Incapacidade#São paulo#Cultura surda

A Pessoa

Claudia aprendeu a jogar de forma diferente porque seu irmão mais novo tinha síndrome de Down. Ela viveu a dinâmica da exclusão desde a infância e viu o preconceito sofrido por seu irmão e sua família. Claudia chegou a ouvir que o certo era deixar o irmão viver “no mundo dele”, separado da realidade, como se ele não pudesse exercer a própria cidadania. A exclusão e problemas crônicos de saúde levaram à morte prematura de seu irmão. Antes mesmo de morrer, Claudia criou algumas iniciativas que promoviam a inclusão, como forma de canalizar sua raiva e desejo de acabar com a exclusão das pessoas com deficiência. Com sua experiência como fonoaudióloga da TV Globo e seu reconhecimento pelo pioneirismo em técnicas e métodos de formação de repórteres de televisão, desenvolveu a capacidade de unir pessoas, atrair talentos e coordenar outros para a ação coletiva. Em 2003, Claudia iniciou seu projeto desenvolvendo o kit Vez da Voz, que consistia em um livro em Braille, língua de sinais e um CD com contos e canções. Acabou se tornando um projeto social que atraiu a participação de centenas de voluntários em todo o país. Ela organizou uma série de eventos públicos onde curtas-metragens foram exibidos, como The Sound of Silence, que ela escreveu. Após um ano, Claudia já havia organizado mais de onze eventos em shoppings (Brasília, Belo Horizonte, Paraná, São Paulo e zona rural). Vendo uma demanda cada vez maior por esse tipo de produto e experiência, ela atraiu o apoio institucional da UNESCO para criar um site que lhe permitisse expandir seu público e fornecer seus materiais gratuitamente aos interessados. A experiência de Claudia na televisão e o contato constante com a realidade das pessoas com deficiência a levam a questionar cada vez mais as barreiras de acesso à informação. Foi a partir desse questionamento que em fevereiro de 2005 fundou a Vez da Voz “para dar voz a quem não tem vez”. Com a vasta experiência de Claudia na formação de repórteres, ela produziu um veículo que pudesse efetivamente atingir pessoas com deficiência, com conteúdo criado para elas e por elas. Foi assim que seu projeto principal, Telelibras, foi fundado em 2007. Embora o projeto tenha começado há apenas seis anos, o grau de comprometimento de Claudia com a causa é visceral. A metodologia de produção do Telelibras já foi implantada para documentários, vídeos informativos e jornais. A organização, embora jovem, tem um histórico de parcerias de sucesso e já acumulou diversos prêmios. A organização de Claudia foi finalista do Prêmio Schwab - Folha de São Paulo do Empreendedor Social (2009) e, mais recentemente, recebeu o Prêmio A Rede de Inclusão Digital na categoria Acessibilidade para o Terceiro Setor.

A Nova Idéia

Com um Ph.D. Doutora em linguística e com mais de quinze anos de experiência como fonoaudióloga para TV, Claudia entende as dificuldades de cegos e surdos para acessar e compreender as informações do cotidiano. Por meio de seu trabalho, ela busca transformar o panorama da mídia para garantir que eles também possam se tornar os principais produtores e consumidores de informação. Claudia fundou a Vez da Voz em um esforço para realmente democratizar o acesso à informação. Com uma equipe formada por pessoas cegas, surdas, com deficiência física ou com síndrome de Down, Claudia criou o Telelibras: um modelo inclusivo e democrático de mídia que combina Língua Brasileira de Sinais, legenda, áudio-descrição, som e imagem. Todos os materiais são elaborados para tornar as informações acessíveis a todos. Algumas das informações também são produzidas e apresentadas por sua equipe, tendo como temas centrais os repórteres com deficiência. Claudia está, assim, introduzindo uma nova abordagem à mídia em que a informação é produzida por e para todos. Tendo consolidado seu modelo, Claudia começa a divulgar amplamente seus programas, com o objetivo de incorporar a abordagem integral na grande mídia, seja ensinando-lhes como produzir programas “universais” desde o início ou adaptando programas anteriormente veiculados por meio de tecnologias inclusivas e publicando-as online. O trabalho de Claudia já está influenciando a mídia brasileira de maneiras consideráveis. Ela está produzindo o primeiro programa de rádio brasileiro em língua de sinais, em parceria com uma grande emissora de rádio (CNB - do Grupo Globo). Além disso, Claudia está disseminando conteúdo em linguagem de sinais para programas da TV Minuto, veiculados em todos os trens do metrô de São Paulo. Ela também fundou recentemente a Inclusive Films Productions e é autora de muitos livros em Braille. De olho no futuro, Claudia desenvolve parcerias com grandes veículos de comunicação para ampliar o acesso a informações gratuitas, de alta qualidade e inclusivas em TV, rádio e Internet em todo o Brasil.

O problema

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, embora 10% da população mundial tenha algum tipo de deficiência, ainda é difícil encontrar modelos universais de produção e divulgação de informações que facilitem conteúdos acessíveis e cheguem a todos. Em 2000, pela primeira vez em sua história, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística incorporou questões específicas sobre deficiência em seu censo demográfico. Esse censo revelou que 14,5% da população brasileira tem algum tipo de deficiência, índice superior à média mundial em função das desigualdades socioeconômicas do país. Em um país em desenvolvimento como o Brasil, a falta de acesso à informação das pessoas com deficiência aumenta drasticamente a exclusão social, exacerbando o preconceito e aumentando a vulnerabilidade social. Em 2000, uma lei federal foi aprovada, estabelecendo normas gerais e critérios básicos para a promoção de espaços públicos urbanos acessíveis, incluindo o sistema de transporte e também os sistemas de comunicação. Mais de dez anos depois, os resultados ainda estão longe do ideal. Embora a acessibilidade física tenha melhorado ligeiramente em algumas cidades, a lei deixou de afetar os sistemas de comunicação de forma significativa. Quem trabalha neste setor não parece ter nenhum conhecimento desta lei. Por exemplo, até hoje, a linguagem de sinais é usada apenas em programas políticos e religiosos. Como resultado, os surdos que aprenderam a língua de sinais têm acesso a informações políticas e religiosas, mas não têm acesso a opiniões e fatos que os ajudariam a formar sua própria opinião sobre o assunto em questão. Além disso, dos seis milhões de surdos no Brasil, apenas 30% sabem ler em português. Previsivelmente, esta segregação é amplamente econômica: quem é alfabetizado em português teve meios financeiros para frequentar escolas privadas e pagar profissionais especializados. Além disso, mesmo os poucos programas de TV que usam legendas não são realmente acessíveis para a maioria de seu público-alvo. A programação de notícias, por exemplo, não inclui de forma alguma o público cego. Por não serem capazes de distinguir imagens de legendas, os cegos legalmente são incapazes de identificar quais sujeitos estão falando, se confundem com paradas abruptas nas narrações e não interagem com programas, comerciais e filmes que usam linguagem visual. Até o momento, não existe um sistema ou modelo de comunicação que utilize uma abordagem acessível para veicular conteúdo para surdos e cegos. Sem acesso a uma quantidade significativa de informações diversificadas e de alta qualidade, as pessoas com deficiência têm suas formas de participar dos processos de transformação que contribuem para uma sociedade mais inclusiva. Isso, por sua vez, aumenta sua vulnerabilidade social e financeira. Evidentemente, a indústria brasileira de mídia audiovisual não é a única a contribuir para a marginalização das pessoas com deficiência. Por exemplo, existem poucos incentivos para a publicação de livros em Braille, a mobilidade autônoma das pessoas em cadeiras de rodas é altamente restrita pela infraestrutura pública e há uma evidente falta de apoio público para fonoaudiólogos, professores e outros profissionais especializados. Porém, a mídia, mais do que qualquer outra área, é a maior força que influencia a opinião pública brasileira. O sistema de comunicação nacional, em especial a televisão, está organizado para atender a uma sociedade que não é diversa: pessoas sem deficiência, com beleza estereotipada e, preferencialmente, brancas. Esta imagem fabricada do país não contribui para a promoção da diversidade. Portanto, trabalhar para que a divulgação de informações por meio da mídia seja acessível a todos significa ajudar a sociedade brasileira a compreender o valor de sua diversidade e a integrar, em igualdade de condições, as pessoas com deficiência.

A Estratégia

Claudia criou o Vez da Voz para permitir que pessoas com deficiência exerçam sua plena cidadania. Para isso, ela se concentra em remover as barreiras que impedem a inclusão da mídia brasileira. Ela acredita que este é o principal desafio a ser enfrentado: mudar a mídia não só garante o acesso à informação para as pessoas com deficiência, mas influencia a sociedade brasileira a desenvolver uma compreensão mais diversificada de si mesma, rompendo assim uma série de barreiras estruturais em todo o país. Para atingir esse objetivo, Claudia sabe que existem muitas fases intermediárias; especialmente porque as empresas de comunicação representam um poder paralelo, sobre o qual o governo e o setor cidadão tiveram pouca influência desde a década de 1960, quando o Brasil entrou em uma ditadura militar de 20 anos. O primeiro passo, já implementado com sucesso pela Vez da Voz, foi a criação e consolidação de um modelo acessível de difusão de notícias denominado Telelibras. Com a Telelibras, Claudia provou que é possível a produção e veiculação de um programa de TV acessível a todos e que inclua pessoas com deficiência na produção e apresentação da cobertura jornalística. A Telelibras reúne muitas tecnologias para garantir sua universalidade: sempre há um intérprete de língua de sinais aparecendo no lado esquerdo do vídeo para surdos que entendem de língua de sinais, audiodescrição (que traduz em voz alta tudo na tela para cegos), legendas em Português para surdos alfabetizados em português e imagens iconográficas que traduzem melhor o conteúdo narrado do que cenas rápidas ou cortadas. Para além da abordagem tecnológica, o modelo mistura conteúdos relevantes existentes com a produção de novos conteúdos, incluindo a participação direta de pessoas com deficiência e a sua divulgação viral na Internet. Essa abordagem cobre todas as etapas da cadeia de valor da informação e pode ser adaptada e usada em programas de TV existentes. Atualmente, a Telelibras veicula boletins semanais de cerca de 10 minutos cada. Os programas abordam vários assuntos da política, esportes, economia, atualidade e outras áreas. A equipe, formada por 27 funcionários remunerados e um funcionário do Ministério da Justiça de Brasília, se reúne periodicamente para definir seus planos editoriais. A produção, composta por filmagens dentro e fora do estúdio, trabalha com repórteres em cadeiras de rodas, com síndrome de Down e com deficiência visual e auditiva. Claudia acredita que a qualidade dos programas produzidos é fundamental para o seu sucesso. Ela, portanto, desenvolveu uma metodologia completa para aprimorar as habilidades de comunicação de sua equipe, usando a linguagem corporal e a expressão fonética. A segunda etapa do plano de Claudia - o reconhecimento e a disseminação do modelo, seja pelo aumento de acessos ao site Vez da Voz, seja pela postagem cruzada de seu conteúdo em outros sites - está se expandindo rapidamente. Em dezembro de 2010, os vídeos disponibilizados no site atraíram mais de 35 mil visualizações mensais. Claudia tem conseguido colocar os programas à disposição do público nas redes sociais e no site da prefeitura de São Paulo. Em dois anos, o Vez da Voz já produziu mais de 250 vídeos e o programa recebeu considerável cobertura das principais emissoras de mídia. Professores de escolas públicas (obrigados por lei a integrar pessoas com deficiência em suas salas de aula) usam os programas como ferramenta de inclusão. A divulgação foi muito além de seu conteúdo. Hoje, por exemplo, os funcionários da Reserva Federal da Caixa estão aprendendo a língua de sinais acessando o site Vez da Voz. A terceira etapa da visão de Claudia envolve transformar a mídia brasileira em uma indústria inclusiva, incorporando seu modelo aos sistemas de comunicação estabelecidos. Ela pretende fazê-lo por meio de dois meios complementares: transformando a forma como os programas são produzidos e veiculados nas principais emissoras de TV para torná-los inclusivos, e traduzindo os programas ao vivo para a linguagem universal que ela desenvolveu para posteriormente disponibilizá-los a todos na empresa. local na rede Internet. Para colocar essas ideias em prática, Claudia tem trabalhado no fortalecimento das relações do Vez da Voz com os principais veículos de comunicação - do setor de comunicação e de outras áreas. Com o Banco Itaú, o maior banco privado do Brasil, Vez da Voz oferece intérpretes de língua de sinais em eventos e reuniões para seus funcionários surdos; o programa oferece curso de língua de sinais para os funcionários da Editora Abril - a maior editora do país. Ao estabelecer parcerias com essas empresas, a rede e o suporte da organização continuam a crescer e ganhar legitimidade. Essas iniciativas também geram renda para a organização e seus colaboradores. Como resultado dessas parcerias estratégicas, surgiram oportunidades com o jornal Folha de São Paulo, a estação de rádio CBN e a Metro TV de São Paulo. Com a Folha de São Paulo, Vez da Voz transformou diversos vídeos institucionais em formatos acessíveis e atualmente estuda formas de ampliar a parceria. A estação de rádio CBN ajudou a lançar um programa único em todo o mundo, uma rádio para surdos, ao publicar o conteúdo completo de um programa de rádio em língua de sinais em seu site. Após o enorme sucesso da iniciativa, a CBN estuda a possibilidade de colocar todo o seu conteúdo em formato de língua de sinais e online. Por fim, em parceria com o sistema de televisão Metro de São Paulo - visto por milhões de pessoas todos os dias - o Vez da Voz produziu vídeo-poemas em linguagem de sinais. Com o objetivo de transformar toda a indústria da comunicação em uma indústria inclusiva e que promova a democratização da informação, Claudia quer usar toda a sua experiência como fonoaudióloga na TV Globo. No entanto, ela acredita que ainda é importante ter algumas evidências da adoção do modelo em um meio de comunicação que não é concorrente direto da TV Globo. Dentro dessa visão, Vez da Voz está negociando a possibilidade de realizar programas conjuntos com a TV Cultura, canal popular reconhecido por seu conteúdo cultural e educacional. Para isso, a entidade busca financiamento público do Ministério da Cultura para a produção de novos programas. No futuro, Claudia quer usar a Telelibras para transmitir mídias de pessoas com deficiência durante a Copa do Mundo e as Olimpíadas e produzir novos materiais educacionais para serem distribuídos gratuitamente em escolas e bibliotecas. Vez da Voz opera como uma organização sem fins lucrativos e garante sua sustentabilidade financeira em parte por meio de um modelo de taxa por serviço. A organização oferece cursos de língua de sinais, interpretação de língua de sinais para eventos e gravações de vídeo inclusivas. Também financia suas operações por meio de palestras e royalties de direitos autorais dos livros infantis que publica, bem como arrecadação de fundos com empresas privadas. Recentemente, Claudia criou a Inclusivo, produtora audiovisual inclusiva que será financiada em parte por leis de incentivo a doações específicas para esse tipo de organização no Brasil, e também venderá - de forma mais direta - produtos e serviços para empresas. Tudo o que for produzido (conteúdos e programas para internet, televisão, telefones celulares, etc.) terá informações com legendas, linguagem de sinais e audiodescrição.